A DOUTRINA DO PECADO ORIGINAL.
O pecado original é uma doutrina cristã que pretende explicar a origem da imperfeição humana, do sofrimento e da existência do mal através da queda do homem. Tal doutrina não existe no judaísmo nem no islamismo. Foi desenvolvida por bispo Irineu de Lyon (ca. 130 — 202), em sua controvérsia com o dualismo do Gnosticismo.
A doutrina do pecado
original se apoia em várias passagens das Escrituras:
a epístola da Paulo aos Romanos (5:12-21) e aos Corintios (1 Co 15:22), e uma passagem do Salmo 51. Mas primeira exposição sistemática sobre o pecado original - de cuja
interpretação derivaram todas as controvérsias - é a de Agostinho de Hipona, no século IV . Foi também no século IV que se deu a
conversão do Império Romano ao catolicismo. Segundo Le Goff,
o dogma do pecado original teria contribuído para aumentar o poder de controle
da Igreja sobre a vida sexual, na Idade Média
Segundo a doutrina, os
primeiros seres humanos e antepassados da humanidade, Adão e Eva,
foram advertidos por Deus de que, se comessem do fruto da arvore do conhecimento do bem e do mal, certamente morreriam. No entanto, instigados pela serpente,
ambos comeram o fruto proibido, tendo Eva cedido primeiramente à tentação e
posteriormente oferecido o fruto a Adão, que o aceitou. Ambos continuaram
vivos, mas foram expulsos do Jardim do Édem. Existem polêmicas quanto ao significado real dessa narrativa,
bem como em que se constituiria tal pecado, se é que seria realmente algum.
Algumas denominações cristãs recentes chegam mesmo a negar a sua existência. Na
perspectiva cristã, contudo, a morte (imerecida) de Cristo é recorrentemente
suposta como necessária para salvar os seres humanos desse "pecado de
origem", que seria congênito e hereditário.
Nenhum trecho bíblico
traz esclarecimentos que possam colocar fim a essa que é uma das maiores
questões do cristianismo. As doutrinas a respeito do pecado original têm sido
historicamente um dos principais motivos para o surgimento de heresia e para os cisma entre os cristãos, desde os primeiros
séculos da era cristã. Várias interpretações divergentes sobre o significado da narrativa contida no livro do Gênesis foram dadas por teólogos, antropólogos e psicanalistas.
Cristianismo
A questão do pecado aparece no cristianismo
principalmente em Agostinho de Hipona (Santo Agostinho), que associa o pecado à culpa herdada por todo o gênero humano
depois que Adão e Eva sucumbiram à tentação do Diabo e, devido ao seu orgulho e egoísmo,
rejeitaram o amor e a obediência devida a Deus. Assim sendo, o pecado original
tem para Agostinho um caráter congênito e hereditário, pois em Adão toda a
humanidade pecou, abrindo as portas para a entrada do mal, da morte física e
espiritual e de todas as suas consequências.
Surge então a questão do Pelagianismo. Pelágio (360 - 435) vê no pecado uma espécie de exemplo a não ser seguido, o que faria com que a
salvação dependesse exclusivamente do ser humano. Segundo Pelágio o pecado não
seria congênito nem transmitido, mas seria adquirido por imitação. Para
Pelágio, o homem nasceria bom e inocente. Agostinho discorda dessa tese e vê
nas doutrinas pelagianas a manifestação da presunção humana que erroneamente
levaria a supor que a salvação depende apenas de nossa vontade, de nossos
próprio atos, escolhas e obras, negando o caráter salvador e redentor de Jesus Cristo. A visão agostiniana do pecado
original foi herdada por todo o cristianismo ocidental e está presente em todas
as denominações cristãs históricas católicas ou protestantes.
A semente da serpente
A semente da serpente é uma nova revelação
doutrinária sobre a questão do pecado original. Esta nova revelação foi
recebida por um evangelista americano que viveu no século XX (1909 - 1965),
chamado William Marrion Branham. Baseado em tradições apócrifas judaicas e gnósticas,
Branham afirmava ter recebido a revelação particular de que o Pecado Original
teria sua origem no fato de Eva ter copulado com a serpente, a qual introduzira
nas gerações humanas sua semente, dando origem a posteridade de Caim, a qual
contaminou toda a humanidade.
Judaísmo e Islamismo
Para o Judaísmo e o Islamismo, não há pecado
original. Judeus e muçulmanos adotam a doutrina pelagiana, embora segundo a doutrina
muçulmana todos os seres humanos ao nascerem sejam tocados pelo Diabo.
Exceções
Todas as religiões cristãs compartilham a crença de
que Jesus Cristo nasceu sem o pecado original. Sua
natureza era em tudo igual à humana com exceção do pecado.
A Igreja Católica Romana, no século XIX, mais precisamente no ano de 1854
através do Papa Pio IX acrescentou a seus dogmas mais uma exceção, a Virgem
Maria, mãe de Jesus, que teria sido concebida sem o Pecado Original: é o dogma
da Imaculada Conceição. Segundo este dogma, a Virgem Maria teria sido
preservada desde sua concepção de toda contaminação do Pecado Original devido a
providência divina, pois ela haveria de ser a Mãe de Jesus Cristo. Esta doutrina
de origem Franciscana data da Baixa Idade Média, tendo sido combatida
enfaticamente por grandes expoentes da doutrina católica especialmente pelos
Dominicanos entre os quais São Tomás de Aquino e pelo Cisterciense São Bernardo
de Claravaux.
O Islamismo afirma que a Virgem Maria não foi
tocada por Satanás ao nascer.
As Igrejas Ortodoxas Orientais afirmam que a Virgem
Maria nasceu com o Pecado Original. Entretanto, ela foi preservada devido a
graça divina de todo e qualquer pecado atual, até ser completamente purificada
do Pecado Original quando se deu a encarnação do Verbo durante a Anunciação.
Psicanálise
Na perspectiva psicanalista foi sugerido que o pecado
mencionado no Gênesis teria sido o ato sexual. Esta explicação não encontra,
contudo, raízes nas tradições judaicas pré-cristãs, em que a união carnal entre
o homem e a mulher foi estabelecida por Deus. Entretanto se o pecado original
fosse o ato sexual, Deus mesmo teria induzido o homem ao pecado, quando
ordenou, crescei, multiplicai e enchei a Terra.
Segue-se uma das explicações
"antropológicas" (entendida no contexto de que o livro sagrado
pretende a apresentação de uma explicação ou uma construção explicativa das
origens do universo, do nosso mundo, da humanidade, da civilização em geral e
da hebraica em particular, e por fim das origens do bem e do mal): Até atingir
a fase da "civilização" o homem vivia no "estado de
natureza", em oposição ao "estado de cultura", explicação essa
totalmente compatível com o evolucionismo darwinista. O comer do fruto da
árvore do conhecimento do bem e do mal seria o divisor de águas, ou seja a
ruptura da comunhão entre o ser humano e a natureza. A partir de então o homem
passou a reconhecer-se como separado e independente da natureza, adquirindo
consciência de sua morte e finitude, adotando valores, crenças e objetivos
independentes da natureza. Deu-se a traumática transição do animal para o hominal,
como definia Teilhard de Chardin.
Como consequência, o homem se envergonhou da nudez,
tomou consciência da morte e da mortalidade, e passou a trabalhar para acumular.
O texto ainda lança uma espécie de enigma da
transcendência: a árvore da vida com seu fruto, impedida ao homem pelas espadas
flamejantes de querubins. Não se trata, evidentemente, de frutas nem árvores,
mas de um simbolismo espiritual cujo significado vem desafiando a humanidade ao
longo dos milênios: o desejo de viver eternamente.
Referências
1Oxford
Dictionary of the Christian Church (Oxford University Press 2005 ISBN 978-0-19-280290-3),
article Original Sin
5. LE
GOFF, Jaques; FRUONG, Nicolas. Uma história do corpo na Idade Média.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2006.
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